sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Teogonia, primeiro verso: o performer e as Musas

Para começar a pensar o primeiro verso da ‘Teogonia’ [‘Pelas Musas do Hélicon iniciemos o canto’], é necessária uma comparação com duas passagens homéricas, ambas delimitando uma oposição entre narrador/performer (aedo) e público da apresentação:

Narrai-me agora, Musas que têm casas olímpias –
pois vós sois deusas, estais presentes e sabeis tudo,
e nós só relato ouvimos e nada sabemos –
quem eram os líderes dos dânaos e os chefes.
A multidão eu não vou enunciar nem especificar,
nem se minhas fossem dez línguas, dez bocas tivesse,
voz inquebrável, e dentro tivesse coração de bronze,
exceto se as Musas Olímpicas, de Zeus porta-égide
as filhas, lembrarem-se de quantos a Ílion vieram.
os capitães das naus direi e a totalidade das naus.
(Ilíada 2, 484-93)

Do varão me narra, Musa, do muitas-vias, que muito
vagou após a sacra cidade de Troia devastar.
De muitos homens viu urbes e a mente conheceu,
e muitas aflições sofreu ele no mar, em seu ânimo,
tentando granjear sua vida e o retorno dos companheiros.
Nem assim os companheiros salvou, embora ansiasse:
pela sua própria iniquidade pereceram,
ingênuos, que de todo as vacas de Sol Hipérion
comeram. Esse, porém, tirou-lhes o dia do retorno.
De um ponto daí, deusa, filha de Zeus, fala também a nós.
(Odisseia 1, 1-10)

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